terça-feira, 29 de janeiro de 2013

Protesto de cientistas em relação à restrição no uso do termo 'olimpíada' faz COB voltar atrás em nota oficial

Com a repercussão negativa, Comitê Olímpico brasileiro admitiu liberar o uso da palavra que, desde 1894, é aplicada para designar competições educacionais em todo o mundo

(JC) O protesto das principais associações de cientistas do país em relação ao movimento do COB (Comitê Olímpico Brasileiro) para impedir o uso da palavra 'olimpíada' em competições educacionais e científicas conseguiu mobilizar a sociedade, repercutir na imprensa e fazer com que a entidade reavaliasse seu posicionamento em nota oficial.

Em 31 de agosto de 2012, O COB notificou judicialmente o Museu Exploratório de Ciência da Unicamp (Universidade Estadual de Campinas), organizador das Olimpíadas de História do Brasil, pelo uso supostamente indevido do termo. Situações semelhantes já haviam ocorrido com as Olimpíadas de Matemática e de Astronomia. Uma das justificativas para a proibição seria uma exigência do COI (Comitê Olímpico Internacional) de que o COB controle o uso dos termos ligados aos Jogos Olímpicos.

Para professores e cientistas, no entanto, o termo é universal, já que existem olimpíadas de diversas áreas do conhecimento em todas as partes do mundo. Os organizadores dos Jogos Olímpicos de Londres, por exemplo, se uniram com as instituições de ensino e fizeram uma série de olimpíadas de conhecimento para aproveitar o sucesso do evento.

Como forma de repúdio a essas notificações, a SBPC (Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência) e a ABC (Academia Brasileira de Ciências) encaminharam, no dia 8 de janeiro, carta a Carlos Arthur Nuzman, presidente do COB. No documento, as instituições que atuam em defesa do avanço científico e tecnológico do Brasil, dizem que a decisão é despropositada e lembram que a palavra é empregada mundialmente para designar competições científicas, tais como International Mathematical Olympiad, Math Olympids for Elementray and Midde Schools, The British Mathematical Olympiad Sibtrust, Science Olympiad, entre muitas outras.

Com a repercussão negativa das cobranças, o COB, em nota oficial, informou que já admite liberar o uso da palavra em questão para fins educacionais. A organização afirma que as cartas enviadas às instituições de ensino têm "caráter educativo", para garantir que "o termo 'olimpíadas', que é uma propriedade do COI, não seja vinculado a questões comerciais".

Matéria publicada em 18 de janeiro pelo Portal UOL diz que o COB comprou briga com a comunidade científica brasileira e que deve desistir da ação. A reportagem traz a opinião da presidente da SBPC, Helena Nader, que lembra a origem da palavra. "O Olimpo não nasceu junto com o esporte. Se alguém quer o direito sobre a palavra, deveriam ser os gregos. Olimpo é uma montanha onde moram os deuses, onde todos almejam chegar. Olimpíada de matemática, história ou ciências não é competição. É algo maior. É a busca pela superação dos limites, não só dos limites físicos. O COB deveria se envergonhar de discutir uma coisa dessas. Receber uma olimpíada esportiva é uma honra, mas receber olimpíadas de matemática ou de ciências é tão importante quanto", argumentou.

Helena Nader defendeu o mesmo posicionamento em matéria publicada pela Folha de São Paulo, que também ouviu Jacob Palis, presidente da ABC. Para ele, é lamentável que a polêmica ocorra num momento em que o Brasil é destaque na área. "Nós recebemos, no ano passado, a Olimpíada Mundial de Astronomia. Agora há pouco, tivemos um jovem brasileiro (Matheus Camacho, 14) ganhando uma medalha de ouro em uma das maiores competições do mundo, a Olimpíada Internacional de Ciência. A decisão do COB é equivocada", afirmou.

Os cientistas não vão abrir mão do uso da palavra. "O COB quer ter o monopólio da palavra e isso nós não aceitamos, disse Nader. "Olimpíada científica é um conceito internacionalmente consagrado. A sua proibição aqui só é prejudicial para o conhecimento", defendeu.

Para o físico Luiz Davidovich, professor do Instituto de Física da Universidade Federal do Rio de Janeiro e diretor da Academia Brasileira de Ciências, não há sentido em limitar a aplicação do termo, considerando que ele é de uso internacional. "Em outros países, as competições internacionais também são assim chamadas, de modo que essa polêmica não se justifica", avalia. "As olimpíadas científicas realizadas no Brasil também têm cunho internacional, elas são importantes para o país e têm que continuar acontecendo. O termo olimpíada é apropriado e validado internacionalmente", conclui o professor.

A polêmica também acirrou o debate jurídico. O assunto foi destaque no Portal Consultor Jurídico e em outros sites especializados em Direito. Raul Iserhard, professor aposentado da UFSCPA, divulgou a carta da SBPC e da ABC em redes sociais. Para a funcionária pública federal Nicole Sigaud , é lamentável a intenção do COB. "De qualquer ângulo que se veja, a atitude foi patética", opinou em carta ao Jornal da Ciência.

Panorama mundial
No mundo, o termo 'olimpíada' nas competições científicas, principalmente em matemática, é usado desde 1894 na Hungria, pioneiro na realização das olimpíadas científicas. Com o passar dos anos, competições similares foram se espalhando pelo leste europeu, culminando, em 1959, com a organização da 1ª Olimpíada Internacional de Matemática, na Romênia, com a participação de países daquela região. No Brasil, a primeira Olimpíada Brasileira de Matemática (OBM) foi realizada pela Sociedade Brasileira de Matemática (SBM) em 1979, três décadas antes do início da Obmep.

Carta de repúdio:

São Paulo, 08 de janeiro de 2013

Ilustríssimo Senhor
CARLOS ARTHUR NUZMAN
Presidente do Comitê Olímpico Brasileiro (COB)

Senhor Presidente,

A Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), entidade civil, sem fins lucrativos nem cor político-partidária, que atua em defesa do avanço científico e tecnológico do Brasil e a Academia Brasileira de Ciências (ABC), receberam com espanto e indignação a informação de que o Comitê Olímpico Brasileiro (COB) notificou extra-judicialmente a Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) pelo uso supostamente indevido da palavra "olimpíada", no nome da competição que organiza, a Olimpíada Nacional em História do Brasil.

Ninguém ignora a importância dessas competições científicas - no país já existem 18 delas - para a divulgação da ciência e o aumento do interesse dos jovens pelas atividades científicas, o que é fundamental para o desenvolvimento tecnológico de qualquer nação e o bem estar econômico e social de sua população.

Sem esquecer que jovens que vencem as olimpíadas nacionais depois vão participar de competições internacionais. E muitos deles têm se destacado, contribuindo para divulgar o nome do Brasil e da ciência e educação do país. É o caso, por exemplo, do jovem Matheus Camacho, de 14 anos, aluno de uma escola de São Paulo, que acaba de conquistar em Teerã, uma medalha de ouro na Olimpíada Internacional de Ciências, concorrendo com estudantes de 28 países.

Por isso, a proibição do uso da palavra "olimpíadas" para designar competições científicas é uma situação que se configura mais despropositada ainda, quando se sabe que a palavra é empregada mundialmente para designar competições científicas, tais como International Mathematical Olympiad, Math Olympids for Elementray and Midde Schools, The British Mathematical Olympiad Sibtrust, Science Olympiad, entre muitas outras.

Assim, a SBPC e a ABC não concordam com a decisão do COB de ter a exclusividade do uso da palavra "olimpíada", pois significará um retrocesso trazendo em prejuízo a todas as tradicionais olimpíadas educacionais (matemática, ciências, língua portuguesa, química, astronomia entre outras) que se realizam no Brasil há anos.

Sempre prontas a defender a ciência e a educação brasileira, a SBPC e a ABC subscrevem,

Atenciosamente

Helena Nader
Presidente
Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência

Jacob Palis
Presidente
Academia Brasileira de Ciências


Nota oficial do COB:

As cartas enviadas às instituições de ensino têm caráter educativo, de forma a garantir que o termo "Olimpíadas", que é uma propriedade do Comitê Olímpico Internacional (COI), não seja vinculado a questões comerciais. O Comitê Olímpico Brasileiro está estudando, em conjunto com o COI, a possibilidade de autorizar a utilização do termo para fins propostos, como por exemplo, pela UNICAMP.

Tão logo tenhamos um posicionamento quanto ao tema, a UNICAMP será formalmente comunicada.

Sobre os símbolos e designações olímpicas, estes são de propriedade do Comitê Olímpico Internacional (COI), que, através da Carta Olímpica, exige dos Comitês Olímpicos Nacionais (CONs) a defesa das marcas em seus respectivos países.

Somente os CONs, os Comitês Organizadores de Jogos Olímpicos e patrocinadores do Movimento têm autorização de uso das marcas, símbolos, designações e demais direitos de propriedade industrial do COI.

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